segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Poema do silêncio

O que é que fiz agora?
Já meti água outra vez?

Não entendo.
Só porque quis ter o furto proibido?


                                                      Paulo José Borges




desenho de Rui Cavaleiro

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Poema das escondidinhas

... noventa e seis, noventa e sete, noventa e oito, noventa e nove, cem.
Alerta alerta: quem ficar atrás de mim fica fica fica mesmo.

Já sei onde estás. Vai ser fácil.
No armário, debaixo da cama, atrás do cortinados, na sala,
na cozinha, na casa de banho...................................
.................................................................................

Ah, estás lá fora, Espera que já te encontro.
Atrás do carro, na carrinha de caixa aberta,
nos arbustos, atrás da roupa a corar, nos tanques,
no patamar do quarto andar.....................................
.................................................................................

Já chega, estou há que tempos nisto.
Aparece. Estás a ouvir? Aparece.
Não está a ter piada. Ganhaste. Aparece.

Que rico amigo me saíste.

Alerta alerta: quem vier atrás de mim fica fica fica mesmo.

                                                                                           
                                                                                       Paulo José Borges

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Poema da porta no meio da parede

By our daylight standard he walked out of security
into darkness, danger and death.
But did he see like that?
H. G. Wells «The door in the wall»

(Era uma porta enferrujada e ela entrou). Fora um impulso,
um capricho que agora lhe poderia trazer consequências nefastas.
A porta, que ainda mostrava claros vestígios de cor verde, gemeu
como um vago lamento. Porém, ela, absorta, obstinada, avançou
com passos seguros pelo jardim bem tratado que se abria perante seus olhos.
Estivera ali, sem dúvida, um jardineiro prendado que semeara
canteiros tão arrumados.

Avançou ainda mais um pouco e, sem acreditar,
apercebeu-se de duas panteras a brincar com uma bola.
E logo sua mente sináptica reconheceu os felídeos do conto de H. G. Wells.
Estacou, aguçou a vista, a procurar o rapaz, a jovem e a senhora
que mostrara ao protagonista o livro da sua vida. Mas deles nem vislumbre.
Decidida a não desistir, depois de mal ter dado azo ao seu ímpeto inicial,
caminhou em direção à floresta plúmbea que se oferecia mais à esquerda.
Embrenhou-se, perscrutou, procurou palavras para mais tarde contar
o indizível, o incomensurável, mas sobretudo para saber como ia
acabar esta história.

                                                                                       Paulo José Borges