segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Soberba

Sobe o mais alto que possas
Finca-te na virgem e não corras
Olha de cima para os que ficam para trás e aos lados
Arma-te em divindade
Fica-te tão bem

Sê rei sê potestade
Só não te esqueças que o jazigo
Dos deuses mortos
É o Jupitério.

            © Paulo José Borges

domingo, 17 de outubro de 2021

Indignação

Quem disse que o que não nos mata 
nos faz mais fortes?
Quem disse que se aprende com os erros?
Quem disse que a dor será recompensada?
Quem disse que a solidão enrijece?
Quem disse que mais vale estar só
do que mal acompanhado?
Quem disse que pedras do caminho?...

Hipócritas. Mais fortes em quê?
Se eu partir um osso em duas ocasiões diferentes
à terceira não quebra?
Eu nunca aprendi com nenhum erro;
volto a cometê-los com cada vez mais firme 
convicção no Pai Natal.
A dor será compensada. Isso sim. Quando
tenho uma unha encravada, se me doer um dente,
esqueço o dedo.
Não aprendi nada; caio sempre na esparrela.
Quando tomo uma decisão ponderada sai sempre furada.
A solidão não tem solução. Não se dissolve:
engana-se como ao estômago com côdeas de pão.
Cada vez percebo mais quem tem gatos.
Cães não, que, ladrando, perfuram inclementemente
a solidão dos vizinhos.
Foi Drummond quem falou da pedra no caminho.
E é muito provável que a tenha carregado toda a vida.
Pedras só para pisa-papéis ou artesanato.
(Embora demasiado tentadoras para atirar aos cães.)
Tenham vergonha. Não mintam às crianças.
Não há mal que sempre dure.......
Pois não, para alguma coisa serve a anestesia
e a couraça.
O Bem, se vier, não se conta, não se monta
como belíssimo templo que não se pode habitar.
O Bem, se vier, só se quer sentar.

                  © Paulo José Borges



segunda-feira, 26 de julho de 2021

Caminho imperfeito

Não sou boa companhia para caminhar contigo.

Mas quem senão tu com mais descrença
Quem senão tu com mais dúvidas
Quem senão tu que quanto mais lhe explicam menos entende
Quem senão tu que mais pense no passado e no futuro do que no presente
Quem senão tu que quando as coisas parecem más as consegue imaginar piores?

Mas para que quererás tu alguém assim?

Porque és tu que estás aqui.

 

                                     Paulo José Borges

quarta-feira, 21 de julho de 2021

Santa Inocência

Tenho tantas saudades
de quem um dia achei que ia ser.

Que coisa mesmo infantil.


                      

                              Paulo José Borges



terça-feira, 11 de maio de 2021

Cheese



Vê se te despachas com a foto
que eu não aguento meter a
barriga para dentro muito mais tempo.


                   Paulo José Borges



domingo, 25 de abril de 2021

Four / Twenty Five (esboço #47)


Abril encarnou na praça
uma canção cravejada de flores
e o povo saiu à rua
de lágrimas em punho.

O momento respirou fundo a recobrar alento
e acordaram todos felizes para sempre.

                                     Paulo José Borges

quarta-feira, 31 de março de 2021

Flauta de pan de mia


Tu achas que só acontece aos outros
Mas eu não.
Tu achas que a máscara não faz falta
Mas eu não.
Tu achas que vives só no meio das multidão
Mas eu não.
Tu achas que tens algo a provar
Mas eu não.
Tu achas-te imune
Mas eu não.
Tu achas que o álcool gel te estraga a pele
Mas eu não.
Tu achas que não tens nada a temer
Mas eu não.
Tu achas que é tudo engodo multinacional
Mas eu não.
Tu achas que é bom morrer vivo
Mas eu não.


                       Paulo José Borges



domingo, 7 de março de 2021

O adiamento


Adia a mente
O dia mente
O que te daria alento
Era só o adiantamento.

Chega-te à frente.
(Que atrás vem gente.)

                          Paulo José Borges