sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Parece um poema de Natal

[Disclaimer: texto com 28 anos de idade. Não aceitamos devoluções.]



                                           Paulo José Borges

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Poema quase bélico

Armas elmos capacetes cascos
Viseiras armas
Cotas de malha armaduras
Armas até aos dentes
Lanças fossos cadafalsos ameias
Armas teias
Armas tramas
Para que invicto não te mostres nu.



                                            Paulo José Borges

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Poema ébrio

Ia agora deliciar-vos com um poema cheio de amor
E de esperança, uma espécie de presente de Natal antecipado.
Mas bebi demais, tenho a cabeça a andar à roda.
Absinto muito.


                                           Paulo José Borges

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Poema pela metade

Sempre gostei de castelos, muralhas e ameias, princesa.
Amei-as porque enquanto escalava era a mim que eu resgatava.

Mas tu permaneceste sempre inexorável
E fingir amor é devassá-lo.

Apesar de tudo, tantos despojos depois, ainda acredito que
Podíamos ter sido felizes a meias.


                                                                    Paulo José Borges

domingo, 23 de outubro de 2016

Poema em mim menor

Eu
Eu acho, eu creio, julgo
Eu
Eu tenho a certeza, eu sei
Eu sou teu amigo, mas se estivesse no teu lugar fazia assim
Eu sei bem o que isso é
Eu já passei por isso, nem me fales

Eu não concordo, não é assim que eu vejo as coisas
Eu penso que tu não podes ser assim
Eu nem entendo por que é que te queixas

Eu sei aquilo por que estás a passar
Eu imagino o que estás a sentir
Eu vou-te ajudar
Eu

Não precisas de me agradecer.


                                                               Paulo José Borges

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Dreamtigers II

                                                                                         a Jorge Luis Borges


Os tigres, três, são
Labirintos engendrados.
Refletem-se em sonhos mal visíveis,
Deambulam amblíopes em ambíguos espelhos
De lendas, sagas e de circos
Que em criança eu cravei na memória.

Depois, fugidios, em bibliotecas de papel, babel, digo,
Os procurei, qual conjurado,
Até me voltarem de novo
Em arquétipos dourados de garras
E de mel.


                                          Paulo José Borges

Eternal Sunshine

                                                                                                                   
                                                                                                      para Suzana


A memória cresce pequenina, fraquinha,
Ou esquecida da vida que foi.
Mas cresce como águas declinadas de montanhas voadoras.

Cresce em sabedoria, em RAMS e ROMS e faz spotless backups nos
Riscos duros da vida.

A memória é lembrares-te de mim
Mesmo toda formatada ou com hard reset.

A memória é a ligação sem fios à tua bondade.


                                                   Paulo José Borges

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

A curva do amor (lido por Rui Cavaleiro)

A curva do amor

O amor quando acordou de manhã foi dar uma curva
Andou de dança tentacular como se tivesse oito vidas.
Deixou veneno polvilhado em todo o corpo do ser amado.
Tão grande era sua persistência que com mil olhos
Aumentava a sua aderência.

Mas a mulher no final
Só viu pó no fim do sonho. Ou como se diz em espanhol
Polvo.


                  Paulo José Borges


desenho de Rui Cavaleiro

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Objects in the mirror are closer than they appear

                                     (Poema do retrovisor)

Vias sinuosas (long and winding roads),
Surgem-nos em patamares, arcades, que temos de completar para
Sermos homens.
Mas não é uma partida que nos salva, nem a fuga com a barriga para frente
Que nos impele a bater recordes.
É saber ir ao lado esquerdo da estrada só as vezes necessárias para
Com toda a minúcia ultrapassar as pedras que as retinas cansadas
Nos semeiam nas artérias.

E, por fim, intuímos que olhar para trás, estúpido Orfeu,
Engana-nos toda a saída.


                                             Paulo José Borges




desenho de Rui Cavaleiro

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Poema do beijo

 Começou por me dizer que o seu caso era simples – e que se chamava Macário...
Eça de Queirós in «Singularidades de uma rapariga loira»



O meu caso deveria ser simples, embora não me chame
Macário.
Encontrei a rapariga loira despida nos ombros e, sem pestanejar,
- Logo eu que de hesitações me alimento -
Aflorei um dos seus bronzeados ombros com meus lábios diligentes.
Simples.

Não o fiz inocentemente, não o fiz dolosamente. Só simplesmente.

Compreendi mais tarde que a marca do meu inexistente batom
Não lhe saía nem por nada. Uma ferida que nenhum unguento
Cicatrizava.
O chão não tremera, as borboletas não esvoaçaram,
Mas a sua reação foi tão singular que acreditei que aquele beijo sozinho não ia
Ficar.

Anos se passaram (aqui uma ligeira prolepse). Poucos mais beijos foram dados
E levados, mas tatuados ficaram em meus ossos de poeta ultra-romântico.
Se eu pudesse roubava-lhe mais alguns deles, que de mim fizeram cleptomaníaco.

Mas sei que nunca me perdoará, quando em desvario lhe disse:
Vai-te! Vai-te.

                                                            Paulo José Borges


                                                                                                Rui Cavaleiro

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Poema do Tupperware



“Um homem tão grande
tem tudo o que quer”
in Poema do fecho éclair de António Gedeão



Abro gavetas, abro gavetões, abro portas
E de olhos esbugalhados saltitam, pululam caixas, caixinhas, tampas, tampinhas.
Azuis clarinhas, laranjas, amarelas, vermelhas, caixas novas, caixas velhas,
Caixas de plástico - de pvc, saltam com molas por todo lado, até no wc.


Filipe segundo tinha talheres de prata,
Só não tinha onde guardar bacalhau com nata.


Tapa tampas de tupperware
Para todas as comidas, todos os restos, para uma serventia qualquer.
Leva um pouco de bolo que sobrou, do assado que queimou,
Leva senão passo meses agoniado em plástico hermético fechado.


Pouco faltava ao grande que dormia em cama de prata maciça, Filipe, senhor do mundo.
Talvez, como a ti, apenas lhe faltasse ouvir o silêncio um só segundo.



                                                                       Paulo José Borges

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segunda-feira, 21 de março de 2016

A história do pastor



A seguir a história do pastor.
O pastor vivia em Goinge, floresta normanda.
Era filho dos senhores da Escânia
hoje conhecedores de ciências.
Aos vinte anos sabia já
distinguir as ervas
curava com esmero os golpes do gado.


Entretinha-se com o queixo.
E todos os arroios
o conheciam de sol a sol.


Aos vinte e seis anos
casou com Dourada, a rapariga débil.
Aos trinta
viu realizar-se um sonho antigo:
receber os primos no pátio.
Abriu então cervejas
fritou amêndoas
falou pela primeira vez de nostalgia.



Daniel Maia-Pinto Rodrigues
O Afastamento Está Ali Sentado
Editora: quasi

sábado, 19 de março de 2016

Uma cidade no teu apartamento

"a city that always makes me think of a whited sepulchre"  
Heart of Darkness, Joseph Conrad 



E regressas ao sepulcro branco que 
Com esmero mandaste erigir.
Criaste-o de branco por fora e por dentro.
Tomaste-o como teu que assim desde sempre o desejaste. 
Rolaste a pedra e meteste-te dentro enroscado.
Aí no interior só te acompanham vagos ruídos de fora dos cães que ladram
Ladram e ladram
Mas a caravana não passa, não passa, não passa.


                                               Paulo José Borges


terça-feira, 15 de março de 2016

Los Borges

Nada o muy poco sé de mis mayores
portugueses, los Borges: vaga gente
que prosigue en mi carne, oscuramente,
sus hábitos, rigores y temores.

Tenues como si nunca hubieran sido
y ajenos a los trámites del arte,
indescifrablemente forman parte
del tiempo, de la tierra y del olvido.

Mejor así. Cumplida la faena,
son Portugal, son la famosa gente
que forzó las murallas del Oriente

y se dio al mar y al otro mar de arena.
Son el rey que en el místico desierto
se perdió y el que jura que no ha muerto.

                          Jorge Luís Borges

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Primeiro poema do tempo comum

Aqui não há nada para ver.

Queres revelações? Desvendar de segredos?
Nada.

É dia após dia 
E abriga-te de pensar.

O caminho é um beco sem sentido
E o comum é desconfiar.

Siga. Andor. É circular.


                                         Paulo José Borges

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Poema dos intervalos de infelicidade














                                                   Paulo José Borges

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

The clock is ticking.

O tempo passa célere, rápido, voraz, ligeiro.
O tempo quer chegar primeiro.

O tempo é o criminoso letal que trazes contigo.

Cada milénio, cada século, cada ano, cada mês, cada hora, cada minuto 
O tempo tudo arrasa
Infracções de segundo.

                     Paulo José Borges

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Poema dulcíssimo

O teu amor está cada vez
Mais enjoativo. Diabético.
Disse-mela.

                  Paulo José Borges